Por Lucas
Borba
Em uma época
na qual as discussões acerca da reparação para grupos historicamente discriminados
e perseguidos reacendeu a todo vapor, é sempre ótimo quando uma produção que
promete dar protagonismo aos chamados “desajustados” e com potencial para
conversar com um grande público é anunciada. Foi o caso de Wandinha, baseada no
icônico universo de A Família Addams, cujas histórias em quadrinhos originais
já renderam adaptações para o cinema e para a TV que permeiam gerações.
A releitura da
Netflix atualiza os exóticos personagens para tempos de TikTok e concentra a
narrativa principalmente em um dos membros da família, a adolescente Wandinha
(Wednesday, no original, interpretada pela excelente Jenna Ortega). Na trama,
acompanhamos as aventuras da protagonista, que, depois de ser expulsa da última
escola em que estudava, é enviada pelos pais para a Academia Nunca Mais
(Nevermore, no original), na qual também foram alunos durante a adolescência.
Lá, além de tentar – ou não – fazer amigos, Wandinha terá que aprender a
dominar suas habilidades paranormais e, talvez, resolver um mistério de assassinatos
em série.
A Netflix me
concedeu acesso antecipado aos oito episódios da primeira temporada, que
estreia nesta quarta-feira, no dia 23 de novembro, no catálogo do streaming.
Agradeço a Netflix pela oportunidade e parabenizo a empresa por cada vez mais investir
na acessibilidade comunicacional dos seus conteúdos, incluindo o serviço de
audiodescrição em português na série – um serviço que descreve os elementos
visuais da obra para pessoas com deficiência visual, como eu próprio, por meio
de uma narração em off. Como audiodescritor consultor desde 2015 e jornalista,
posso afirmar que tal recurso de acessibilidade não apenas amplia o público potencialmente
contemplado pela Netflix, como permite que produtores de conteúdo com
deficiência, como eu, também possam produzir um material de qualidade acerca de
nossas experiências com essas narrativas.
Dito isso,
antes de tudo é preciso pontuar que Wandinha, em primeira instância, é uma
série pensada para um público adolescente – o que não impede, obviamente, que
eventualmente algum adulto também se identifique com o programa. A garota
compartilha a natureza considerada mórbida da família e tem gostos peculiares, apreciação
por cadáveres, exumações e um humor bastante questionável, características que
baseiam o bom e velho conflito de uma personagem adolescente que precisa
encontrar sua identidade e descobrir seu lugar no mundo – não por acaso, a
protagonista é enviada para uma academia de excluídos que, ainda assim, agem
como se ela fosse a mais estranha do grupo. Uma investigação criminal e pitadas
de magia sobrenatural completam a fórmula da produção, um show que só não fica
acima da média por não ousar mais nos roteiros dos episódios e subestimar a
inteligência do público-alvo.
Tecnicamente,
a série está muito bem servida, contando com ninguém menos do que Tim Burton
como produtor executivo, que também dirige o primeiro episódio. O mistério
central da temporada – mesmo contando com uma resolução previsível, descobrir o
vilão antes que a trama o revele não é uma tarefa exatamente difícil – é engajante
em seu desenvolvimento, não pela resolução em si, como dito, mas pelos
desdobramentos envolvidos no processo investigativo, pelos ambientes sombrios
percorridos e, particularmente, pela forma como a progressão narrativa trabalha
em favor da construção de personalidade da heroína – certamente, o ponto alto
da série. Verdade seja dita, no primeiro episódio Wandinha parece apenas uma
adolescente chata, mas com o avanço dos capítulos vamos nos aprofundando nas
camadas dessa personagem, que, se por um lado se revela muito mais humana do
que transparece a princípio, nunca dá exatamente o braço a torcer, encontrando
sempre um jeito próprio até mesmo para reconhecer um erro. O quinto episódio,
no qual Wandinha divide o protagonismo com a mãe Morticia (Catherine Zeta-Jones)
e Gomez (Luis Guzmán) é um dos mais vívidos da temporada e traz à tona o que de
melhor se observa da influência de Tim Burton para a história.
Sem as
pontuais quebras de ritmo graças a clichês adolescentes pouco inspirados e com um
mistério que valorizasse mais seus pontos altos, Wandinha poderia chegar ao
patamar de um clássico adolescente contemporâneo para a televisão, a exemplo de
títulos como “Buffy, a Caça-Vampiros” no final dos anos 90. É, contudo, uma
adição divertidamente sombria ao catálogo da Netflix para tiktokers de plantão.
Nota: 3/5
“Wandinha” (Wednesday)
– 1ª temporada, EUA, 2022.
Criação: Alfred
Gough e Miles Millar.
Duração: 50
minutos por episódio (em média).
Hashtags:
#paracegover #paratodosverem #paratodomundover #paratodosveremmais
#audiodescrição #descriçãodeimagem #descrevipravocê #acessibilidade #inclusão
#cultura #culturapop #arte #audiovisual #recursosinclusivos #série #tv #netflix
#netflixbrasil #crítica #wandinha #Wednesday #afamíliaaddams #timburton
Comentários
Postar um comentário